Autor: Fís. Carlos Leandro Silva dos Prazeres
Revisão: Fís. Alessandro A. Mazzola e Fís. Matheus Telka Gonçalves
O magnetismo desempenha um papel crucial na imagem por ressonância magnética, sendo necessário utilizar um campo magnético muito forte para criar imagens detalhadas do corpo. No entanto, essa intensidade traz consigo o problema da atração de objetos em direção ao aparelho, e é aqui que entram as Variações Espaciais do Campo Magnético (VASCO). Quando um paciente realiza um exame de ressonância magnética, ele é posicionado no espaço central da máquina chamado isocentro (Figura 1), onde se obtêm as melhores imagens. À medida que nos afastamos do isocentro, a intensidade do campo magnético diminui, prejudicando a qualidade das imagens formadas.
Por isso, é imprescindível compreender o VASCO para garantir a segurança do paciente e a qualidade do exame, especialmente para situações em que o paciente é portador de algum dispositivo médico implantado compatível com RM. Ao longo do texto, entenderemos melhor o que é VASCO e como essas variações espaciais do campo magnético podem afetar o procedimento de ressonância magnética.
Figura 1: Esquema de um sistema de Ressonância Magnética evidenciando o isocentro do equipamento. Fonte: Adaptado de MOSER et al., 2008.
Em um setor de imagem por ressonância magnética, uma preocupação relevante é a presença de objetos ferromagnéticos próximos ao equipamento, pois eles possuem forte atração magnética quando expostos a um campo magnético externo. Em equipamentos modernos de ressonância magnética, o campo pode aumentar rapidamente com a distância (Figura 2), o que pode resultar em objetos ferromagnéticos sendo repentinamente atraídos para o aparelho. O caso do advogado baleado pela própria arma ao entrar na sala de exames (Figura 3) destaca esse perigo.
Figura 2: Razão da força translacional pela força gravitacional para um equipamento de 3T. Quanto maior essa razão, maior será a força de atração de objetos ferromagnéticos. Fonte: The physics of MRI safety 2017.
Figura 3: Caso do advogado baleado pela própria arma em São Paulo. Fotos da perícia mostram arma dentro de máquina de ressonância magnética. Fonte: Reprodução/TV Globo.
VASCO, abreviação que criamos para as VAriações espaciaiS do Campo magnéticO, é um conceito fundamental na área da ressonância magnética. Ele se refere aos campos magnéticos periféricos ao redor do aparelho de RM, fora do isocentro. Essas variações espaciais podem afetar a intensidade do campo magnético em diferentes partes do aparelho e têm grande importância para a segurança do paciente. Compreender o comportamento das VASCO é essencial para garantir não somente a segurança dos pacientes, mas influencia todo o processo de tomada de decisões referentes às medidas mais adequadas para evitar problemas relacionados aos campos magnéticos em torno do aparelho de ressonância magnética.
Dependendo do site planning*, uma variação espacial do campo magnético moderadamente grande pode se estender por vários metros, acima e abaixo de um aparelho de ressonância magnética. Gráficos de campo, como mostrados nas Figuras 4-6, estão disponíveis em cada fabricante e para cada tipo de equipamento.
*Site planning é a planta baixa contendo um mapa das linhas de campo magnético da sala de exames e suas adjacências que o fabricante do equipamento disponibiliza para a instituição durante os projetos de construção das salas de RM. Nele, estão todas as medidas e considerações de infraestrutura necessárias para a instalação do equipamento.
Figura 4: Mapa do gradiente espacial magnético, Siemens Magnetom Avanto. Fonte: Magnetic Resonance Implementation Site Planning, Siemens.
Figura 5: Mapa do gradiente espacial magnético, GE Signa HDx 1.5T. Fonte: Site Planning, GE Healthcare.
Figura 6: Mapa do gradiente espacial magnético, Panorama HFO. Fonte: Technical Description, Phillips.
Em teoria, a intensidade do campo magnético é inversamente proporcional ao cubo da distância do isocentro do magneto. Logo, ao nos afastarmos do equipamento a uma distância de 3 vezes, é esperado que o campo diminua aproximadamente 27 vezes!
Quando um objeto desse tipo é exposto a diversos campos magnéticos de intensidades variadas, ele é atraído para o mais intenso. Esse processo se repete conforme o objeto se move em direção a regiões com campos magnéticos mais fortes e para quando o objeto ferroso alcança uma área onde o campo magnético não esteja mais mudando ou colida com outro objeto. Essas Variações Espaciais do Campo Magnético (VASCO), são descritas pela fórmula dB/dx (expressa em tesla por metro [T/m] ou gauss por centímetro [G/cm]), em que “d” representa variação, “B” é o campo magnético local e “x” é a distância.
Vale lembrarmos da conversão:
1 T/m = 100 G/cm
Por isso, é imprescindível que dispositivos implantados, compatíveis com a MRI, possuam um limite para o gradiente espacial magnético, garantindo a segurança do paciente (Figura 7). Cada fabricante de RM disponibiliza um manual do sistema com informações importantes sobre o aparelho, juntamente com o mapa do gradiente espacial magnético (Figura 8). Para utilizá-lo, é essencial compreender o ponto de vista da máquina, seja lateral, superior ou frontal, e observar os números que representam as distâncias em metros. O zero corresponde ao isocentro, ponto central da máquina. Medir a distância entre o dispositivo médico implantado e o isocentro ajuda a determinar sua segurança durante o exame de IRM. É crucial seguir as recomendações de segurança, referentes ao VASCO, para que o paciente possa realizar o exame sem problemas. É essencial evitar que o dispositivo implantado seja exposto a uma variação espacial do campo magnético maior do que as condições definidas pelo fabricante.
Figura 7: Exemplo de uma lista de condições de um implante específico de Stent, trazendo limite máximo para gradiente espacial de campo magnético.
Figura 8: Variações Espaciais do Campo Magnético. (a) Mapas de contorno para um scanner Siemens Aera 1.5 T. (b) Superfícies de iso-gradiente de scanners Philips Achieva e Intera 1.5 T. Fonte: Adaptado de MCROBBIE; GRAVES; ELIZABETH ANN MOORE, 2017.
Por causa de marca-passos mais antigos que podem ser afetados por campos magnéticos acima de 5 gauss (0,5 mT), a US Food and Drug Administration (FDA) estabeleceu diretrizes para proteger o público desprevenido da exposição a campos de 5 G ou mais. Ademais, é válido ressaltar que, campos menores (1-3 G) podem afetar os scanners de TC e RM próximos, campos de 10 G podem afetar computadores, enquanto campos de 30 G podem magnetizar relógios e até danificar cartões de crédito!
Embora alguns centros de imagem por ressonância magnética utilizem detectores de metal, é importante saber se eles detectam todos os metais ou apenas os ferromagnéticos. Esses instrumentos complementam a segurança, mas não substituem a triagem minuciosa do paciente por um profissional treinado em segurança em ressonância magnética. A segurança é primordial, pois determinados objetos metálicos podem causar lesões graves, vamos priorizar a segurança sempre!
Referências:
[1] ELSTER, A. D. Fringe magnetic fields. Disponível em: <https://mriquestions.com/what-are-fringe-fields.html>.
[2] MCROBBIE, D. W.; GRAVES, M. J.; ELIZABETH ANN MOORE. MRI from picture to proton. Cambridge: Cambridge University Press, 2017.
[3] MOSER, E. et al. Magnetic resonance imaging methodology. European Journal of Nuclear Medicine and Molecular Imaging, v. 36, n. S1, p. 30–41, 23 dez. 2008.
[4] PANYCH, Lawrence P.; MADORE, Bruno. The physics of MRI safety. Journal of Magnetic Resonance Imaging, v. 47, n. 1, p. 28-43, 2018.
[5] REDERER, M. Reading the Magnetic Spatial Gradient Map. Disponível em: <https://riteadvantage.com/reading-the-magnetic-spatial-gradient-map/>.